Mãe fala sobre a morte de dois filhos por suicídio: ‘Seguir em frente é um desafio diário’

“Nasci e moro em Juazeiro do Norte, no interior do Ceará. Minha infância e adolescência foram marcadas pelo meu pai, um homem violento e abusivo. Apesar de seu controle obsessivo, consegui fugir dos ataques e fazer com que minha mãe e meus irmãos se afastassem dele. Aos 21 anos, engrenei um namoro com aquele que seria o pai de Felipe e Davi. Era muito nova, mas já tinha sofrido um bocado. Apaixonei-me, engravidei e dei à luz Felipe. Davi nasceu quando o primogênito tinha 1 ano. O pai das crianças os registrou, mas nunca os criou. Em 2002, conheci o meu marido, Máximo, pai da minha filha, Eva, hoje com 8 anos. Formamos uma família, e ele, minha mãe e meus irmãos me ajudaram a educar os meninos. Graduei-me em Direito e a vida parecia entrar nos eixos. Quis dar a eles a estabilidade e o cuidado que não tive. E consegui.

Antes de contar o que aconteceu com os meus filhos, quero deixar bem claro uma coisa: Felipe, meu mais velho, não sofria de depressão. Era um jovem alegre, cheio de amigos, frequentava a igreja, tocava violino, estava no segundo ano do ensino médio, era um ótimo aluno e uma criatura doce. Tinha muitos sonhos e planos. Se alguém me perguntasse: ‘Qual é o seu maior medo em relação aos seus filhos?’ Responderia: ‘Acidente, doença, bala perdida’. Jamais teria citado suicídio. Não fazia parte do nosso contexto.

Aos 15 anos, Felipe se apaixonou por uma moça da igreja. Ela tinha cinco anos a mais do que ele, e aí começou o problema: a mãe dela não permitiu o namoro. Essa impossibilidade causou uma tristeza no meu filho. Eu estava sempre ao seu lado, fazendo com que lidasse com aquela situação da melhor maneira possível. Até que a mãe da jovem, um ano depois, finalmente, deu o tão aguardado consentimento. Jamais vou esquecer a felicidade que compartilhamos quando ele me transmitiu a notícia, fiquei com o coração leve pela alegria dele. Porém, as restrições aos encontros permaneceram, e os dois passaram a se desentender.

Vale ressaltar que isso não tem nada a ver com o curso de Psicologia, as visito como mãe, até porque não me formei ainda. O que penso para o futuro, quando me tornar psicóloga, é ter um local de acolhimento para essas mães e uma equipe multidisciplinar que possa atender inclusive quem não tem condições financeiras. Também quero fazer palestras sobre suicídio pelo Brasil afora e realizar uma pós-graduação em suicidologia para atuar na prevenção e na posvenção. Com a intenção de quebrar o tabu, contei minha história no documentário ‘Para os que ficam’, que aborda os sobreviventes enlutados, de Susanna Lira, e vai ao ar, em 2023, no GNT. As pessoas têm de parar de não falar sobre suicídio. O preconceito ainda é muito grande. Porém, não é calando que vamos ajudar quem está sofrendo.” O Globo.

Foto: Rafael Mazza