
O Tribunal de Justiça do Rio (TJRJ) condenou, nesta segunda-feira (18), as influenciadoras Nancy Gonçalves e Kerollen Vitória Cunha, a 12 anos de prisão por injúria racial, em regime fechado. Mãe e filha publicaram vídeos nas redes sociais entregando bananas e um macaco de pelúcia para crianças negras em maio de 2023, em São Gonçalo, na Região Metropolitana.
Além disso, as duas também terão que pagar R$ 20 mil de indenização a cada uma das vítimas. De acordo com a decisão da juíza Simone de Faria Ferraz, elas poderão recorrer em liberdade, mas seguem proibidas de publicar conteúdos semelhantes e manter contato com as crianças.
No documento, a magistrada afirma que, por meio dos depoimentos, ficou evidente que as rés estavam cientes de suas condutas. “Por anseio de aplausos, de visualizações, de sucesso e sim, optaram por perpetrar os crimes que lhes foram imputados”, explicou.
Segundo a decisão, a defesa argumentou que ambas não sabiam sobre racismo. “Nada mais absurdo querer fazer crer que nesses dias de conhecimento imediato, fácil acesso, as rés não soubessem o que é racismo. Não viviam as rés em tribo isolada, sem rede social, longe de tudo e de todos, absortas em si. Não e não! Foi a ré Nancy que afirmou com vaidade extrema que contavam com ‘quase vinte milhões de seguidores'”, disse a juíza.
Ferraz destacou ainda que o caso não se trata de apenas uma “inocente brincadeirinha”. “As rés criaram conteúdo, ridicularizaram as crianças. Pouco importa se no momento em que R. recebe uma banana e L. um macaco de pelúcia não tivessem, naquele momento, repito, a perfeita consciência da chibata em seus pequenos corpos. Não, o crime se protrai no tempo e ganha contornos de verdadeira monstruosidade quando publicam, sem dó e respeito, suas reações imaturas e inocentes em rede social. Destaco que o momento em que se dá a consumação é justamente após as postagens, com a extrema divulgação, nesse momento é que após cientes das ofensas as crianças são vitimadas”, frisou.
Por fim, a juíza destacou os efeitos que o conteúdo provocou na vida das vítimas. Segundo a mãe, o menino nunca mais foi o mesmo, necessitando de acompanhamento psicológico.
“Destaco ainda as severas consequências de sua conduta reveladas pela vítima e sua genitora. Asseverou a mãe que o menino nunca mais foi o mesmo, passou a ser um menino nervoso, que necessita de acompanhamento psicológico, que precisou mudar de escola, deixou os amigos. Não só. Visivelmente abalado foi firme e asseverou que ficou muito triste, que não pode ser visto como um animal, que é um ser humano. Tal discurso revela a dor”, diz um trecho do documento.
Em nota, a defesa das influenciadoras manifestou respeito ao Poder Judiciário, mas discordou da decisão.
“As rés sempre colaboraram com o processo e confiam que a Justiça reconhecerá sua inocência. Por isso, será interposto recurso ao Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, visando a reforma da condenação. A defesa reafirma seu compromisso em demonstrar, nas instâncias superiores, a verdade dos fatos e a plena correção da conduta das acusadas”, relatou em nota.
O caso veio à tona em maio de 2024, após a advogada Fayda Belo, especialista em direito antidiscriminatório, denunciar a ação de ambas nas redes sociais. Em um vídeo, ela chamou a atitude de Kérollen e Nancy de “racismo recreativo”, que se trata da prática disfarçada de humor, quando alguém usa de “discriminação contra pessoas negras com intuito de diversão”.
Nos vídeos, mãe e filha pedem para as crianças abordadas nas ruas de São Gonçalo, na Região Metropolitana, escolherem entre um presente ou dinheiro. Em dois casos específicos, quando as crianças optam pelo presente, ambas negras, uma ganha uma banana e outra um macaco de pelúcia.
Kérollen e Nancy, que possuíam uma conta conjunta nas redes sociais, somando mais de 1 milhão de seguidores no Instagram e 13 milhões de inscritos no Tiktok. Na época, o Ministério Público do Rio (MPRJ) recebeu mais de 700 denúncias contra elas e chegou a bloquear os perfis das acusadas, que afirmaram não terem a “intenção de fazer qualquer referência à temáticas raciais ou à discriminação de minorias”.
Indiciadas pela Polícia Civil pelo crime de racismo, a dupla também foi investigada por coação, depois que a mãe de uma das crianças dizer que Kérollen e Nancy ofereceram dinheiro e cesta básica à mulher para que ela não denunciasse o caso.