Delegado Péricles pode ser condenando por falsificação de documento público da ‘Pec Miojo’

O dia era quinta-feira, 3 de dezembro, e os deputados da Assembleia Legislativa do Estado (ALEAM) preparavam-se para mais uma sessão plenária, onde, como em qualquer dia, homenagens seriam prestadas, projetos seriam votados, mas alguma coisa parecia estar fora do lugar.

Não eram muito mais do que 15h, quando entrou em discussão a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 005/2020, que pretendia alterar a data da eleição do novo presidente da Assembleia, do dia 17 de dezembro para o dia 3, convenientemente, naquela quinta-feira.

É que previamente, antes que uma proposta de emenda ser apresentada em sessão plenária, é necessário que todos os 24 deputados da casa estejam a par da discussão, e esse processo de ordem parte da convocação dos líderes de cada partido da casa, juntamente do presidente da ALEAM, no caso, Josué Neto (PRTB), em uma Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) a qual discute-se cada PEC antes de ser votada. Processo o qual precisa ser documentado e assinado por todos presentes. É uma forma de garantir que não existam fraudes no processo de articulação de votos.

Alessandra Campelo (MDB), sendo a líder do seu partido, não foi convocada para nenhuma reunião prévia, e sequer havia recebido uma cópia impressa da PEC 005, nem mesmo na sessão plenária. Logo, exigiu ao presidente da casa que apresentasse o documento que comprovasse a reunião de apreciação da proposta, documento que em tese deveria constar a sua assinatura.

Josué Neto respondeu com um sorriso debochado, levou a sessão a diante, ignorando a deputada, o processo legal, e o regulamento da casa. Acontece que a documentação atestando as reuniões em comissões realmente existia, estava na mesa da Assembleia. O detalhe é que o documento existiu, mas era forjado, falso, fraudulento.

Golpe Orquestrado

O trabalho de falsificação, investigado pelo Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM), é atribuído ao deputado Delegado Péricles (PSL), que pode agora responder pelo crime de falsificação de documento público, por ter fraudado os papéis que atestam reuniões em comissões que, de fato, nunca aconteceram.

O ato de criar documentos atestando que teriam sido realizadas reuniões, que de fato não ocorreram, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e, em ato contínuo, na Comissão Especial formada pelos líderes dos partidos – sendo que diversos deles não foram convocados – pode se enquadrar no crime de falsificação de documento público, previsto no Artigo 297 do Código Penal Brasileiro.


O deputado poderá ter, ainda, pena agravada em 1/5, caso o Poder Judiciário entenda que ele se prevaleceu do cargo de deputado, e também do de presidente da CCJ da Casa, para criar a documentação e assim, permitir que fosse alterada a Constituição do Estado do Amazonas, tudo em um lapso de tempo de apenas 15 minutos.

Jogo dos 7 erros

A 10° reunião da CCJ, ocorrida na última quinta-feira, já havia sido remarcada outras três vezes e deveria ocorrer no dia 9 de dezembro, mas acabou ocorrendo na quinta, na presença de apenas três dos seis integrantes: Serafim Corrêa (PSB), Wilker Barreto (Podemos) e Delegado Péricles. Porém, as assinaturas deles – manuscrita ou digital – não constam na ata.

Belarmino Lins (Pros) e Joana Darc (PSC), que também são integrantes da CCJ, não foram informados previamente da mudança de data, ocasião em que tramitou a PEC, conforme denúncia feita na tarde daquele mesmo dia pelos próprios deputados.

Além disso, a tela do sistema da ALEAM, que controla a tramitação dos processos no Legislativo, mostra que o autor da propositura de mudança da Constituição não é um deputado específico, e sim a própria CCJ, presidida pelo Delegado Péricles.

Na mesma imagem, é possível acompanhar o lapso de tempo em que tudo aconteceu, até que a Constituição foi alterada. Conforme o documento, a CCJ deu início na tramitação da proposta de alterar a Constituição, às 9h52, quando foi protocolada. Às 9h58, foi protocolado o regime de urgência da PEC. Porém, o parecer da CCJ só foi protocolado às 11h11 e o parecer da Comissão Especial foi protocolado às 11h16. Ou seja, a votação e aprovação do parecer antecedeu a submissão da PEC.

Vale ressaltar que todas as entradas de documentos referentes a ‘decisão’ da CCJ foram feitas pela assessora do deputado Delegado Péricles, Hemilly Costa Monteiro. Outro ponto importante de se salientar, é que o deputado Wilker Barreto, que até então estava na reunião da CCJ, estava ao mesmo tempo inscrito como primeiro orador, no pequeno expediente, falando diretamente da tribuna.

Outra análise de uma possível fabricação dos documentos, é que o parecer só pode ser votado na CCJ depois que consta em pauta e, neste caso, só foi para pauta depois das 13h, sem constar que seria em regime de urgência como ocorreu, entrou com o prazo normal de 5 dias para tramitação. “Como você analisa na CCJ logo que não constou em pauta?’, contestou um assessor parlamentar consultado pelo site.

Para especialistas em Direito Criminal ouvidos pela reportagem, só o lapso de tempo é prova material suficiente para provar que as reuniões não aconteceram de fato e que foram, na verdade, simuladas, para que fosse possível produzir a documentação usada no dia. Outro elemento probatório, seriam as declarações, ao vivo, durante a sessão plenária, dos deputados Belarmino Lins, Cabo Maciel e Joana D’arc que fazem parte da CCJ e afirmam não te recebido qualquer convocação para reunião.

Como o delegado tem foro privilegiado, a tramitação do processo penal deverá ocorrer no âmbito do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM) e a pena prevista neste tipo de crime é de reclusão, de 2 a 6 anos, além de multa. Deverá ser pedido, também, o afastamento do parlamentar para que possam ser conduzidas as investigações na casa.