
Quebras de sigilo bancário mostram que entidades envolvidas no esquema bilionário de fraudes contra aposentados do INSS repassaram valores milionários a empresas que operam consignados sob suspeita. As transações acenderam o alerta da Polícia Federal (PF) sobre a relação entre os descontos indevidos nos benefícios e a atuação dessas empresas.
A suspeita é que as entidades usavam os contratos para ampliar artificialmente sua base de filiados — majoritariamente aposentados — e assim cobrar mensalidades via convênios com o INSS. Estima-se que mais de 6 milhões de beneficiários tenham sido filiados compulsoriamente a associações e sindicatos, que arrecadaram ao menos R$ 6,3 bilhões desde 2019.
O escândalo foi revelado pelo portal Metrópoles, a partir de dezembro de 2023, em uma série de reportagens que mostraram o crescimento acelerado da arrecadação com mensalidades — R$ 2 bilhões em apenas um ano. As entidades citadas acumulam milhares de ações judiciais por fraudes nas filiações.
As publicações deram origem a um inquérito da PF e embasaram apurações da Controladoria-Geral da União (CGU). Ao todo, 38 matérias foram citadas pela PF na representação que resultou na Operação Sem Desconto, deflagrada em 23 de abril, e que levou às demissões do presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, e do ministro da Previdência, Carlos Lupi.
A PF investiga se empresas contratadas para vender consignados a aposentados incluíam, sem consentimento, filiações a entidades que aplicavam os descontos mensais. Contratos mostram que essas empresas lucravam por cada nova filiação.
Os pagamentos sob investigação foram feitos por três entidades: Ambec, Unsbras (atualmente Unabrasil) e Cebap — todas ligadas a parentes ou funcionários de empresas associadas ao empresário Maurício Camisotti, apontado como beneficiário final do esquema.
Somente duas empresas receberam R$ 15 milhões. Uma delas é a HKM, de Herbert Kirstersson Menocchi, ex-gerente do BMG. Um contrato entre a HKM e a Cebap previa que os vendedores de consignado oferecessem também a filiação às entidades — com as empresas ficando com a primeira mensalidade e 30% das seguintes.
Outra empresa é o Balcão das Oportunidades, que também se apresenta como correspondente do BMG. Ela recebeu R$ 5 milhões da Ambec e possui contratos milionários com a Cebap.
Outras associações, como Amar Brasil (ABCB) e Master Prev, também mantêm vínculos com empresários do setor. Ambas têm diretores que são familiares de Américo Monte Filho, dono de empresas de consignado. A PF identificou movimentações superiores a R$ 320 milhões apenas da Amar Brasil, parte delas destinadas a correspondentes bancários.
O advogado Conrado Gontijo, que defende Menocchi, afirmou que a defesa está tranquila quanto ao conteúdo dos autos e que está à disposição das autoridades. Segundo ele, a HKM presta serviços lícitos e atua com respeito à lei.
O BMG informou que Menocchi não integra seus quadros desde 2022 e que não mantém qualquer vínculo com o grupo desde então. O banco disse ainda desconhecer os fatos relacionados ao esquema investigado.